O Futuro É Já… outra vez. E outra. E mais outra
O Futuro É Já… outra vez. E outra. E mais outra.
Por um cronista ligeiramente enojado com déjà-vus com gel no cabelo:
Pedro Nuno Santos apareceu de novo, ou, para ser mais preciso, reapareceu, porque esta gente nunca desaparece, recolhe, espera, faz a barba e tira novas fotografias com fundo azul, e regressa como se nada fosse.
A bandeira é nova, a tática é velha, e o perfume político é o mesmo, Eau de toilette "Governei-mas-agora-é-que-é".
“O Futuro é Já!”, grita ele, com o entusiasmo de quem acabou de descobrir a palavra “futuro” numa bolacha da sorte da Marinha Grande.
Ora, se o futuro é já, não devia haver tempo para reuniões, comícios ou powerpoints.
Devia começar por devolver os comboios comprados à CP que ainda não chegaram, ou pelo menos confessar que já viu este futuro nalgum Conselho de Ministros anterior, provavelmente numa quinta-feira, com Medina ao lado e Costa a bocejar.
Pedro Nuno fala como quem acabou de descer do Monte Sinai, mas a tábua que carrega são as mesmas promessas da década passada, ligeiramente atualizadas com emojis e jargão TikTok.
Depois diz que é ele e o povo, o povo, sempre tão útil, sempre tão presente nas frases e tão ausente nas decisões.
“Sem intermediários”, exclama, enquanto o palco atrás dele se enche de gente que já intermediou tudo, do SIRESP às PPP, passando pelos pareceres da IGF que ficaram em cima da mesa, como croquetes frios.
Um pequeno detalhe, este homem foi ministro das Infraestruturas durante o governo de António Costa, aquele mesmo que governou o país como quem monta uma estante do IKEA sem instruções, mas que no fim faltavam sempre peças.
Sim, Pedro Nuno, o engenheiro dos comboios que não chegaram, dos aviões que não descolaram e do aeroporto que ainda está mais enterrado que o processo das gémeas brasileiras.
Sim, Pedro Nuno Santos é o ex que promete que “agora vai ser diferente”, que está mais maduro, mais focado, mais responsável, só que o álbum de fotografias revela o contrário.
Esteve presente nos bastidores de todos os falhanços recentes, do lítio em Montalegre ao escândalo da Habitação a custos (in)controlados com Marina Gonçalves, outra cria da máquina, promovida da Juventude Socialista ao ministério como quem passa do estágio para administrador da empresa pública.
A TAP, recordemos, foi nacionalizada sob a sua batuta, numa operação digna de um mágico amador, desapareceu dinheiro, reapareceu polémica, e a única coisa que voou foi a CEO para outro país, com os bolsos e a conta bancária bem aconchegada.
E quem são esses bravos rostos do novo futuro? Velhos conhecidos, uns com mais rugas, outros com mais botox, todos com o mesmo talento para o imobilismo dinâmico.
Essa é a geração que nos prometeu TGVs sem linha, aeroportos sem licença, e habitação acessível para quem herda casas da avó em Alfama.
É este o PS renovado de PNS, aquele partido que se reinventa como uma pastelaria, muda o nome do bolo, mas a massa é sempre folhada.
E agora? Agora é o futuro, mas sem intermediários, diz ele, enquanto se rodeia de nomes como Ana Catarina Mendes, que há décadas faz pontes entre o povo e os gabinetes de avenidas largas, pontes essas que costumam ruir em comissões parlamentares.
Ao lado, Fernando Medina, o “cofreiro” do défice, que tratou o Ministério das Finanças como quem trata um mealheiro, apertado, opaco, e sempre a cair das mãos.
Não falta também Alexandra Leitão, a teórica da função pública que, num comício recente, conseguiu fazer parecer que a reforma da administração pública, passa por não se fazer nada.
Mas não se fica por aqui.
Entre os rostos do novo PS, que supostamente vai romper com tudo, encontramos também os clássicos.
Carlos César, sempre pronto a lembrar que os Açores estão longe, mas os tachos do continente são mais quentes, ou Francisco Assis, o eterno centrista com alma de cronista, que aparece sempre que é preciso um ar respeitável para justificar uma decisão questionável.
E como não falar da mais reluzente pérola da nova velha geração, André Pinotes Batista, produto puro da JS, moldado a gesso e glitter, agora é elevado a oráculo de ocasião.
Um daqueles quadros intermédios do regime que, não tendo feito nada de particularmente memorável, conseguiu a proeza de estar sempre lá, como a humidade nas paredes de um prédio do PER.
Pinotes, o comentador dos comentários, surge nos ecrãs com a solenidade de quem descobriu a democracia anteontem, mas a quer explicar aos outros com a autoridade de um deputado por correspondência.
Um homem que comenta tudo, opina sobre nada e consegue sair de cada painel televisivo com a sensação de missão cumprida, mesmo que ninguém se lembre exatamente do que ele disse.
É o Cristiano Ronaldo das generalidades, sempre pronto para marcar um golo de trivela em temas como “a importância do diálogo” ou “os desafios da nova geração”, sem nunca se comprometer com coisa alguma, nem mesmo com o verbo no presente.
Brilha com aquele entusiasmo plastificado de quem aprendeu a discursar em congressos de juventudes partidárias à meia-noite, depois de 14 horas de moções, bifanas e gasosa.
Tem um penteado milimetricamente calculado e um vocabulário calibrado entre o politicamente responsável e o perigosamente irrelevante.
Se Pedro Nuno é o ex que promete que mudou, Pinotes é o primo novo que aparece nos almoços de família já com cartão de visita, a falar de “resiliência” e “reskilling” enquanto os adultos ainda estão no caldo verde.
Não espanta que o PS o empurre para a frente, é telegénico, previsível, domesticado e, sobretudo, reciclável, e no partido da mudança que nunca muda, isso vale ouro, ou pelo menos, tempo de antena.
Desde 1974 que o PS promete mudar tudo, e com notável sucesso, pois tem conseguido mudar tudo para que tudo fique na mesma.
São os mestres do eterno regresso, do “novo ciclo”, da “viragem”, do “recentrar”, como se o país fosse um volante de Renault Clio a precisar de alinhamento.
A verdade, caros leitores, é que Pedro Nuno Santos é o político ideal para os portugueses, promete o futuro com ar zangado, veste o passado com roupa nova, e ainda nos faz sentir culpados por duvidar dele, porque se não for ele, quem será?
Montenegro? Ventura? Um holograma de Guterres? Não, é e tem que ser ele, o ex com gel no cabelo, pronto para mais uma volta no carrossel da governação, com a promessa, que agora vai ser diferente.
E talvez seja, mas só na cor do fundo dos cartazes, porque no resto, bom, o resto já nós sabemos de cor e salteado, não havendo nada mais trágico, numa sociedade traída, do que um povo que ainda finge estar surpreendido.