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Barrabás - o Barba Azul

Barrabás - o Barba Azul

Sérgio Sousa Pinto - o malabarista do PS

Barba Azul, 15.04.25

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Meu caro Sérgio Sousa Pinto, é sempre um prazer, para mim, ouvir a tua voz grave a ecoar nos corredores do poder, como um eco distante replicado no tempo em que a elegância cínica se confundia com a lucidez. Com a tua pose de velho liberal envergonhado, dentro de um fato do Partido Socialista, és, talvez, a última peça de porcelana em cima da mesa da comesana, onde todos já comem em pratos e copos de plástico.

O país deve-te muito, embora ainda não saiba exatamente o quê.

Talvez a arte de dizer pouco com um ar de quem diz muito, ou a capacidade rara que tens, de parecer uma figura de Estado, mesmo quando o conteúdo é mais digno de um editorial, onde a comunicação combina passividade com agressividade, de forma indirecta e pouco eficiente. A tua especialidade é a crítica interna, esse desporto de bancada, que adoras e que não compromete, não constrói, mas te tem garantido sempre um lugar na primeira fila da moral superior.

Lembras-te da Juventude Socialista? Provavelmente sim, afinal, foi o único período da tua carreira em que lideraste alguma coisa, sem pedir desculpa por isso. Mas mesmo aí, a tua marca foi mais de pose do que de pulso, mais de retórica do que de rumo. O que ficou do teu tempo à frente da JS foi um rasto de ambições frustradas, frases feitas e um carreirismo embrulhado em verniz ideológico.

Há décadas que te apresentas como o estereótipo perfeito do político, que se julga demasiado inteligente para sujar as mãos na realidade.

Aliás, preferes pairar, comentar, distanciar, como se isso te colocasse acima da mediocridade, quando, na verdade, apenas te fixa nela com mais pretensão. Tens um talento raro para ser oposição dentro do próprio partido, sempre com aquele tom de mártir esclarecido, como se estivesses a pagar o preço por uma lucidez que mais ninguém compreende.

A verdade, Sérgio, é que já ninguém tem paciência para o teu número.

O PS deu-te tudo, tribuna, tempo de antena, estatuto, imunidade para dizeres todo o tipo de disparates com ar de sapiência. Em troca, ofereceste a mais descomprometida das lealdades, retribuindo com a elegância do cinismo, essa arte de parecer culto, enquanto, na realidade, te afirmaste, na prática, em mais um inútil.

Nunca fizeste uma reforma, nunca tiveste uma ideia que não fosse reciclada de outros. E, mais grave, nunca tiveste coragem de lutar por nada que não fosse a manutenção do teu próprio pedestal.

A tua carreira é um catálogo de notas dissonantes num concerto em que nunca tocaste nenhum instrumento. Uma sequência de “nãos”, ditos com voz grave, como se isso bastasse para se construir um país. Mas o país, Sérgio, não se constrói com lamentos, ironias ou colunas no Público, constrói-se com acção, coisa que tu abandonaste ainda antes de saires da JS.

É fascinante como alguém que começou tão cedo consegue, tantos anos depois, continuar a prometer-se a si mesmo, como se ainda fosse uma promessa. Mas o tempo passou, e agora não passas de mais um comentador do vazio, um veterano de guerra que nunca entrou em combate.

Em ti, o PS encontrou não um militante, mas um oráculo sem compromisso. A tua coragem é exemplar: dizes tudo o que pensas, desde que isso não exija que te mexas, que arrisques ou que lideres. Tens o dom da crítica como quem tem uma herança que não pediu, ou talvez a tenha pedido, mas disfarçadamente, com o ar de quem estava apenas a passar por ali.

É notável como consegues ocupar espaço político sem levantares um único dedo para transformar o que quer que seja. Tens ideias, claro, mas são ideias para serem ditas, não executadas. O país, Sérgio, precisa de gente que se levante, mas tu continuas sentado, altivo, irónico, e perigosamente confortável.

O teu lugar na história está garantido e será recordado, como aquele que avisou de tudo e não fez nada, como uma qualquer Cassandra, que se dizia possuidora do dom de anunciar profecias em que ninguém acreditava, mas sem a tragédia, tu, ficaste apenas pela crónica.