Há Jéssica no Barreiro. Haverá pontaria?
Jéssica Pereira candidata-se ao Município do Barreiro. Essa jovem promessa eternamente debutante da CDU, anunciou com pompa e circunstância a sua candidatura à Câmara Municipal do Barreiro.
Como é uso do figurino habitual, traz consigo a mesma cassete com cheiro a mofo, embrulhada em papel reciclado de esperança operária, tingido com slogans que nem os apoiantes e defensores do PREC aguentariam mais ouvir. É pena. Talvez corrija a pontaria a tempo.
Com um sorriso estudado de, sou e venho do povo, mas com LinkedIn, Jéssica promete ouvir as pessoas, como se isso fosse uma ideia revolucionária, afinal, só tiveram 50 anos para tentar. Fala de proximidade e valores colectivos, com a convicção de quem nunca marcou presença numa reunião de condomínio. Diz querer um Barreiro para todos, o que, vindo de uma força política que divide o mundo entre camaradas e exploradores, soa a comédia involuntária.
Jéssica Pereira, a mais recente encarnação da eterna juventude comunista, foi candidatada pelo coletivo à Câmara Municipal do Barreiro, não com um projecto, mas com um conceito etéreo de mudança, ou melhor, com um alinhamento cósmico de boas intenções genéricas e chavões reciclados, cuidadosamente embalados para parecerem conteúdo.
Na sua apresentação pública, Jéssica conseguiu o prodígio político de falar durante vinte minutos sem dizer absolutamente nada. Nada sobre habitação, nada sobre mobilidade, nada sobre regeneração urbana, investimento, desenvolvimento económico ou cultura. Mas muito sobre valores, proximidade, confiança e outras palavras que enchem espaço sem comprometer ninguém com coisa alguma. A herança da JCP cola-se à da JS... Dizer muito sem significar nada. É pena. Talvez acerte no alvo para a próxima.
A sua campanha é uma aula de ilusionismo político, critica o passado recente da autarquia como se não carregasse qualquer responsabilidade herdada das décadas em que a CDU tratou o Barreiro como feudo pessoal. Agora, promete modernização e inovação, como se um cartaz, em fundo vermelho com martelo e foice, ainda tivesse algum apelo para além do núcleo duro de nostálgicos de assembleia.
Fala-se de um Barreiro para todos, sem uma linha que explique como. Promete-se uma gestão transparente, como se a transparência se resumisse a sorrir muito e citar o 25 de Abril. A candidatura de Jéssica parece construída com o entusiasmo de uma reunião do núcleo de juventude e a profundidade programática de um panfleto do Lidl. Esperamos que afine a mira. A oposição faz-se com propostas e não com sonhos.
É uma campanha onde o vazio é elevado a estratégia, porque comprometer-se com ideias claras significaria expor-se a escrutínio. O melhor é manter tudo nebuloso, sentimental e cheio de referências a tempos gloriosos em que a CDU ainda governava o concelho, como se isso fosse uma credencial e não uma explicação para muitos dos problemas que existem ainda hoje. A Jéssica tem que sair da camisa de forças do passado e afinar a pontaria. Afinal de contas, deveria representar uma nova geração.
No fundo, a candidatura de Jéssica é como um cartaz mal colado numa parede já pintada de promessas falhadas. Tem cor, tem forma, mas quando olhamos de perto, está vazio. E no Barreiro, que bem conhece os ecos do passado, talvez o silêncio programático gritado por esta candidatura diga mais do que qualquer comício.
Jéssica não devia ser o rosto fresco da mesma narrativa gasta, um rosto que tenta parecer novo enquanto repete, palavra por palavra, o manual dogmático de sempre, sem qualquer renovação ou contributo próprio de uma juventude que é envelhecida pela máquina partidária. A sua candidatura não é uma proposta, é um ato de fé, fé em que o eleitor do Barreiro tenha amnésia selectiva e memória curta e os mortos se levantem das tumbas para ir às urnas.
Mas talvez funcione. Afinal, nesta terra onde os trilhos do comboio são mais estáveis que as promessas eleitorais, tudo é possível. Até Jéssica ser levada a sério e acertar no alvo.